quarta-feira, 14 de maio de 2014

CRÔNICA DA SEMANA: A urgência de publicar e o papel do editor

por Robertson Frizero

Vender livros em um país de não-leitores é uma tarefa árdua e, por vezes, muito ingrata. E tudo se torna ainda mais complicado quando o que se quer vender é um texto mais elaborado, com um tema menos óbvio e fácil - um livro que, enfim, fuja aos padrões daqueles que efetivamente vendem milhares de cópias no Brasil.

A tarefa de vender livros é dura por conta de toda uma engrenagem de mercado na qual se somam os custos elevados de produção, as dificuldades de distribuição e venda, as dificuldades por vezes impostas por algumas grandes livrarias e o difícil convencimento do leitor brasileiro para que adquira - e não copie - um livro de qualidade. Do preço final de capa, a fatia que cabe à editora é mínima, por vezes menor até que o valor pago aos autores. Nessa difícil matemática do mercado editorial, as editoras ditas comerciais precisam vender e, por isso, dependendo de sua filosofia e linha editorial, deixam de lado a qualidade e abraçam o apelo dos títulos mais populares para poder sobreviver.

Em meio a essa luta entre o mar dos leitores e o rochedo das grandes editoras, o escritor iniciante sente-se como o marisco que precisa se agarrar ao primeiro aceno de bondade para ver sua obra publicada. Nesse fiapo de esperança, muitas editoras pequenas veem sua fonte de recursos - mas pouco funcionam como editoras no sentido clássico do termo. Muitas delas, a bem da verdade, agem como meros prestadores de serviço: o escritor novato, cheio de esperanças de futuro e urgência de publicar seus escritos - que, muitas vezes, são frutos de anos de trabalho dedicado -, submete-se a bancar parte ou a totalidade dos custos de publicação da obra; como fornecedora de serviços, interessada em ganhar dinheiro pela tarefa executada, a editora não faz ressalva alguma sobre o teor do texto, a capa, os detalhes de edição, fazendo tudo como o cliente preferir; como não há investimento dessas editoras na obra lançada, também não há qualquer esforço de divulgação ou mesmo de posicionamento do livro no mercado. Não raro o resultado são escritores com seus livros publicados como haviam sonhado, mas com centenas de cópias empacotadas da obra em sua própria casa, sem recursos para distribuir e vender seus livros à espera de leitores.

Talvez o maior mal que tais editoras causem ao escritor iniciante seja justamente a falta de uma avaliação maior dos originais. O papel do editor é, em verdade, o de trazer uma luz de realidade sobre a obra que o escritor acalentou com tanto carinho mas que, não raro, precisa de ajustes e do olhar distanciado de um profissional do mercado livreiro. O bom editor é, antes de tudo, um leitor voraz e um apaixonado por livros, que conhece bem o labor literário ao ponto de apontar caminhos ao invés de somente oferecer ao escritor uma carta de recusa pré-fabricada. Seu papel de "primeiro leitor" pode ser decisivo para transformar uma boa ideia em um livro de sucesso. Mas isso também significa que muitos escritores que submeterão seus trabalhos a essas editoras comerciais receberão um "não" como resposta - e aprender com as respostas negativas a um trabalho que nós, escritores, consideramos pronto é uma virtude difícil de conquistar.


Em um momento no qual é tão fácil a autopublicação, quer seja em papel ou em e-book, facilidade oferecida com qualidade por empresas como a Amazon, é de se questionar qual o objetivo do escritor antes de se submeter a essas editoras-prestadoras-de-serviço, que não tem capital ou não estão dispostas a investir nos autores. Se a intenção é registrar em papel sua obra, mesmo sabendo que ela não é comercialmente atrativa; ou se a intenção é editar a obra para divulgá-la e, quem sabe, buscar posteriormente uma editora que o adote em seu elenco de autores, uma autopublicação sob demanda talvez seja o que se necessita naquele momento. É óbvio que há muitas editoras pequenas, porém honestas, atuando com lisura no mercado, lutando bravamente para se manter e com propostas sinceras de dar espaço a bons autores. Mas também há outras que deveriam ser interditadas pela polícia, com seus concursos literários fajutos que servem apenas para arrecadar dinheiro dos participantes e nenhum retorno concreto oferecem às carreiras dos "premiados" além da publicação de antologias que ninguém lerá além do círculo de amigos dos pobres autores publicados. Há muitos vendedores de ilusão no nosso vasto mercado editorial, que apesar de tudo cresce a olhos vistos. É preciso aprender a separar o joio do trigo, a fugir dos cantos de sereia.

Ao escritor iniciante, cabe a escolha: entregar sua obra às facilidades dos "prestadores de serviço" ou submeter-se ao escrutínio das editoras comerciais. O grande desafio, na primeira opção, é fazer o livro circular além dos limites de seu círculo de amigos e contatos; na segunda, é ter o controle necessário para compreender o que há por trás de cada avaliação de sua obra - que será, enfim, julgada não só pelo ponto de vista estético ou pela importância do tema escolhido, mas também por questões mais prosaicas que vão desde a sua possibilidade de vendas em um mercado editorial cada vez mais competitivo até às reais possibilidades financeiras daquela editora em assumir o seu projeto de publicação. De qualquer modo, é essencial, para quem sonha em um dia ser um escritor reconhecido, a humildade de saber que ninguém nasce um gênio.


*Robertson Frizero é escritor, tradutor e dramaturgo. Coordena e ministra oficinas de Criação Literária na Sapere Aude! Livros, além de coordenar o Clube de Leitores da livraria. 

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